quinta-feira, 29 de março de 2012

O notável foguete, Óscar Wilde


[...] De repente, ouviu-se uma tosse forte e seca e todos olharam em redor.

Era um foguete de altivo porte, amarrado à ponta de uma comprida vara. Tossia sempre antes de fazer qualquer observação, como para chamar a atenção.

- Hum! Hum! - disse ele, e todos se dispuseram a ouvi-lo, excepto a pobre Roda Catarina, que continuava a abanar a cabeça e a murmurar: «O romantismo está morto».

- Ordem, ordem - gritou um Petardo. Tinha algo de um político e sempre tomara parte importante nas eleições locais, de modo que conhecia as frases empregadas no Parlamento.

- Completamente morto - murmurou a Roda Catarina, que voltou a dormir.

Não bem se restabeleceu por completo o silêncio, o foguete tossiu uma terceira vez e começou. Falava com voz clara e muito lenta, como se estivesse ditando as suas memórias, e olhava sempre por cima do ombro à pessoa a quem se dirigia. Tinha na verdade umas maneiras muito distintas.

- Quão feliz é o filho do rei - observou -, por casar-se no mesmo dia em que me vão disparar: Na verdade, nem preparando-o de antemão poderia resultar melhor para ele; mas os príncipes têm sempre muita sorte.

- Ah! Sim? - disse o pequeno Busca-pé. – Pensei que fosse precisamente o contrário e que iríamos ser lançados em honra do Príncipe.

- Talvez seja este o seu caso - respondeu ele. - De facto, não tenho dúvida de que seja, mas comigo é diferente. Sou um foguete notável e descendo de pais notáveis. A minha mãe foi a Roda Catarina mais famosa do seu tempo, célebre pela graça da sua dança. Quando fez a sua grande aparição em público, deu dezanove voltas antes de apagar-se, lançando em cada volta sete estrelas vermelhas no ar. Tinha três pés e meio de diâmetro e estava fabricada com pólvora da melhor. O meu pai era foguete como eu e de procedência francesa. Voava tão alto, que o povo temia que não voltasse a descer. Descia, contudo, porque era de excelente constituição e realizou uma queda brilhantíssima, em forma de chuva de chispas de ouro. Os jornais escreveram, em termos muito lisonjeadores a respeito da sua façanha. Na verdade, a Gazeta da Corte chamou-o de «um triunfo da arte pilotécnica».

- Pirotécnica, pirotécnica, é o que quereis dizer! - disse um Fogo-de-Bengala.

- Sei que é «pirotécnico», porque vi isso escrito na minha própria caixa.

- Bem, mas eu digo pilotécnico - respondeu o Foguete, num severo tom de voz, e o Fogo-de-Bengala ficou tão esmagado que começou imediatamente a mortificar os pequenos Busca-pés para demonstrar que ele também era uma pessoa de bastante importância. [...]



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