Entrevista realizada por Beatriz
Martins Ferreira, 12ºF, nº 4
Entrevistado: António Cândido de
Costa, 73 anos
P: Qual era a sua idade no ano em que ocorreu a revolução de 25 de Abril?
R: No ano da revolução tinha, se bem
me lembro, 27 anos.
P: Onde estava ou o que fazia nesta
data?
R: Estava aqui, na cidade de Viana
do Castelo, a trabalhar de empregado de mesa num restaurante e cervejaria
situado na Avenida dos Combatentes.
P: Alguma vez sentiu medo de
Salazar?
R: Não. Nunca senti medo de Salazar,
mas havia uma coisa que ninguém tirava ao povo português, que era o respeito
que toda uma nação sentia com o vibrar desse nome. Naquele tempo havia muito
respeito não só a Salazar, mas também ao hino Nacional. Agora ouve-se o hino
por tudo e por nada e antes não se experienciava isso, apenas no fecho da
televisão Nacional, na RTP ou quando nos era transmitido algo sobre o governo.
As pessoas levavam isto muito a sério porque a PIDE andava sempre infiltrada no
meio do povo, às vezes eu parava e pensava que não podia confiar em ninguém,
porque não conseguíamos distinguir os polícias políticos do restante povo.
P: Falou na Televisão. O que era
mostrado ao país a partir desse meio de comunicação?
R: O que nos era mostrado era pouco
ou quase nada.... Só víamos o que os mestres do governo queriam que nós
víssemos. Na televisão eram-nos mostrados fados, touradas, teatros... tudo
coisas que serviam apenas para deixar o povo entretido e confiante de que mais
nada era necessário... Tudo aquilo que nos era mostrado não nos enriquecia, só
tornava as nossas opiniões e atitudes mais monótonas e previsíveis. Notícias
estrangeiras nunca entravam no país, ou seja, para além de não sabermos o que
se passava cá dentro, também não eramos informados do que ocorria no exterior.
O mesmo acontecia com a imprensa, todas as revistas ou jornais antes de ser
lançados tinham de passar pela PIDE que aprovava ou não o que lá estava
explicito e, caso não fosse aprovado, eles riscavam com uma esferográfica azul.
P: Alguma vez foi confrontado com a
PIDE?
R: Nunca fui confrontado com a PIDE.
Andei a ser seguido depois de vir da guerra do Ultramar porque o meu posto era
radiotelegrafista e, como sabia comunicar por códigos maioritariamente o código
morse e presumo que a Polícia Política me seguia para se assegurarem de que eu
não usaria este conhecimento para uma ação contra o governo. Lembro-me que os
radiografistas, durante 5 anos, não podiam sair do país sem uma autorização
escrita e assinada pelo quartel de Viana do Castelo (VC9) pagávamos 5 escudos
para ter essa senha. Ainda sobre a perseguição, ia todos os dias um indivíduo
para a esplanada onde eu trabalhava e ao acabar o meu trabalho deslocava-me
para a estação para poder regressar a casa e, na carruagem onde eu ficava o
mesmo indivíduo estava lá presente, era constantemente seguido, de Cerveira a
Viana e de Viana a Cerveira. Só soube que este fulano era agente da PIDE depois
de dado o 25 de Abril, porque ele acabou por ser preso. Mas quando estive em
lisboa, a trabalhar numa padaria, tive um patrão que era agente da PIDE e um
dia eu e um colega tínhamos de levar pão para outro posto de venda, mas como
eram cestos muito grandes e pesados nós não conseguíamos levar e dissemos-lhe
que não o íamos levar e ele respondeu-nos “Se vocês não o levarem, vou chamar a
polícia! Porque o que você estão a fazer não passa de uma greve!” nós ainda
retorquimos e dissemos que não e ele convicto afirmou em tom de ameaça, “Não!
Ides, e ides já, porque eu sou da PIDE e já chamei a polícia”. Estes foram os únicos
contactos que eu tive com os agentes.
P: Como soube que tinha havido uma
revolução?
R: Só no dia seguinte. Ao ir para o
trabalho é que soube que se tinha dado a revolução. Mas cá em Viana não se
sentiu muito isso porque estava tudo totalmente vigiado e controlado pois,
nesse período vinha cá o Américo Tomás devido a uma inauguração, então esse
tema do 25 de Abril acabou por se sentir mais abafado.
P: Acha que a Revolução beneficiou
Portugal?
R: Sim nuns aspetos, mas noutros
talvez não... Um dos aspetos mais positivos foi a mudança drástica do conceito
de liberdade. Antes uma pessoa vivia muito oprimida. Eu nunca senti muito essa
opressão. A única coisa que senti foi a pressão drástica de quando tive de ir
para Angola, mas o que se fazia sentir era um país amuralhado, um português não
podia ir a qualquer lado porque não haviam tantos meios de transporte, tantos
restaurantes... no fundo não eram dadas oportunidades de alcançar ou conhecer
novos horizontes e a fome e pobreza que se faziam sentir, sendo dos maiores
motivos da emigração do povo. A liberdade de expressão foi o que mais deixou as
pessoas em alvoroço, poder finalmente dar uma opinião sem medo de um fim mais
desastroso, com a liberdade de imprensa, a nação começou finalmente a ser
alimentada com notícias não só do país, mas também do mundo. Em relação a
questões políticas eu não posso dizer muito porque não me interessavam os
movimentos realizados pelos mestres. De que me adiantava saber mais se eu não
tinha liberdade para dizer que não estava de acordo com tal? Nada. Sempre fiz
por não saber muito disso. Mas marca a liberdade como um benefício “mãe” do
grande 25 de Abril.
*Sophia de Mello Breyner Andresen, poema "Hoje é a madrugada que eu esperava"
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