quinta-feira, 23 de janeiro de 2020

Fala-me de Livros de Natal - vídeo resumo

Fala-me de Livros com Catarina Oliveira

Apresentação dos livros Um lobo nunca abandona a sua alcateia e Heróis entre estrelas.





Fala-me de Livros com Sérgio Carvalho

Apresentação do livro "A Vingança dos Sentidos" de Sérgio Carvalho, professor do nosso
agrupamento.
10 de dezembro 2019



No meu peito não cabem pássaros: interpretação e intertextualidade

No meu peito não cabem pássaros, Nuno Camarneiro
Interpretação da obra e intertextualidade


Neste livro interessou-nos particularmente a história de Fernando, personagem que, após a travessia pelo Atlântico, chegara à cidade antiga da sua vida e à casa da tia, onde iria morar.

Fernando reconhece a cidade nos seus passos - “Habituou-se a medir as distâncias em passos para que o corpo as possa entender.” (CAMARNEIRO, 2011, p. 25), espreita e configura mentalmente a sua geografia, e procura entender a cidade que lhe será anfitriã.

Fernando é cercado do afeto e apego das tias, no entanto precisa também de se adaptar aos cheiros e austeridade da casa e à vida que se configurava nas ruas da cidade.

Após a sua chegada, agoniado por uma febre, Fernando recebe todo o tipo de tratamentos, no entanto dá-se conta que a sua febre está escondida no seu espírito, em desejos colados ao corpo, numa insatisfação ou incompletude que o transforma dia-a-dia, numa inquietude que representa a sua inabilidade em adaptar-se a nova vida.

Ele escrevia de maneira febril, quase obsessivamente sobre tudo, sobre o mundo que o cercava, sobre as pessoas, as coisas e sobre si mesmo. “No meu peito não cabem pássaros” (CAMARNEIRO, 2011, p. 36) é a descrição do sentimento, da sensação que Fernando tem na sua crise de febre, um incómodo constante, inquietante. Uma febre que, segundo o narrador não pode ser curada, mas tem de ser vivida, ao ponto que o deixa doido e lhe muda o rumo.

Fernando cura-se da febre, os pássaros do peito virariam os heterónimos, o corpo escreveria o que Lisboa lhe causara na alma, e a alma sopraria ao corpo o que dele pretendia: “Não há proteções eficazes contra as emoções cantadas e há quem fuja, quem enlouqueça e quem escreva poemas. Em Lisboa, entre as oito da manhã e as oito da noite, as cabeças enchem-se de eco e cada um faz o que sabe fazer.” (CAMARNEIRO, 2011, p. 46).

O Fernando Pessoa elaborado por Nuno Camarneiro é uma personagem a iniciar um percurso. O surgimento da vontade de escrita do jovem Fernando é o começo de todo um processo de multiplicidade e construção poética. Processo este que não só delimita a sua indiferença ao mundo externo, como também mantem a ideia da poesia como o esvaziamento do próprio espírito das diversas vozes que nele habitam.

As palavras passam a preencher-lhe o tempo e a preocupação, levam ao içar da sua multiplicidade inerente e à consequente criação dos heterónimos: “Todos deveríamos ter diferentes palavras para “eu”: o eu que eu sinto, o eu que tu vês, o eu que eu não sou.” (CAMARNEIRO, 2011, p. 50).

Mais tarde, Fernando precisa desenvencilhar-se dos móveis antigos da casa da tia, dos cheiros e da antiguidade do sangue para talvez na solidão se encontrar perdido no meio de tantos eus. Descobrindo-se assim uma personagem inconformada com o mundo mas também com as pessoas.

Ao pensarmos em Fernando Pessoa baseando-nos na sua biografia e no seu pertencimento histórico a um determinado local, absorver e transformar em personagem a sua aura de isolamento, a sua solidão e ao mesmo tempo toda a genialidade que o constituiu nunca será uma configuração exata da complexidade que realmente foi.

Tal como o próprio Fernando Pessoa em Textos Filosóficos diz: “Personalidade supõe complexidade” (1906).

Contudo, no livro “No meu peito já não cabem pássaros”, Fernando Pessoa é construído da melhor forma a partir da sua mais evidenciada peculiaridade da vida - a distinção.

Concluindo, numa narrativa onde a ficcionalidade aponta para a maneira como Fernando Pessoa compreendia o mundo em que viveu, a ficção de Camarneiro torna-se escrita de Pessoa; é uma flexão entre o real e o imaginário, numa construção efetiva e pluridimensional da figura ficcional que o poeta foi na sua própria existência, numa desconstrução e conseguinte reorganização da personalidade sempre enigmática de Pessoa.

12º D - Escola Secundária de Santa Maria Maior - 2019

Fala-me de Livros com Nuno Camarneiro

Encontro com Nuno Camarneiro
11 de dezembro de 2019
Fala-me de Livros / Feira do Livro de Natal












Imagens da Leitura: No meu peito não cabem pássaros

Ilustrações a partir da obra "No meu peito não cabem pássaros" de Nuno Camarneiro. Pelos alunos do 12º E - Artes Visuais, no âmbito do projeto Ler para Ser Maior (aLer+).