quinta-feira, 15 de abril de 2021

Onde estava no 25 de abril?

 

Os alunos do K.Leio respondem mais uma vez ao desafio da professora Fátima Lopes no âmbito da disciplina de História. Desta vez, entrevistaram familiares, vizinhos e conhecidos sobre esse dia em que "emergimos da noite e do silêncio"*.

Entrevistada: Adelina Morais

Entrevista realizada por Ana Beatriz Pereira, 12ºF


“Onde estava a Dona Adelina no 25 de Abril?”

R: “Quando recebi notícia de que a ditadura tinha caído em Portugal, estava a viver em França, em Avinhão, não sei se conhece. Liguei à minha irmã, que me contou o que se estava a passar no país e eu mal podia acreditar: perguntei-lhe se estava a mentir, mas ela continuava a dizer que não, que tinha mesmo acabado, e como eu costumo dizer, caído ‘como o Salazar caiu da cadeira’.”

“Que diferenças pode notar no país após o 25 de Abril?”

R: “Eu não estava a viver cá nessa altura, mas posso-lhe dizer uma coisa: a mudança não foi de um dia para o outro. Os costumes, as mentalidades da época... não se alteraram logo, percebe? Muita gente ainda apoiava o regime, achava que era o melhor para Portugal, apesar da oposição tê-lo derrubado, mas isso não surpreende. Faziam quase que uma… como se diz? Uma lavagem cerebral nas pessoas.”

“Como era a vida antes da Revolução?”

R: “Eu fui viver para França em… 62, acho eu, mas antes disso, sei que se via muita, mas muita miséria. A minha família tinha condições, mas na época, isso era uma exceção à regra, porque a maioria das pessoas mal tinha um pão pra comer. Andavam a pedir, descalços… e o regime não fazia mesmo nada. Fingiam que estava tudo a correr muito bem, mas na realidade… enfim, era triste ver o país numa situação daquelas, mas toda a gente se conformava, dizia que não havia nada a fazer, que ‘é o que é’.”

“O que a levou a emigrar?”

R: “No meu caso, não saí do país por causa do regime, apesar de não gostar nada daquilo. Mudei-me para França para estudar, o que era raro para raparigas naquela altura, diga-se de passagem. Lá terminei o liceu e pouco tempo depois, conheci o meu marido, e pronto, lá ficamos de vez. Meus filhos nasceram os dois em Avinhão e ainda lá moram, mas no verão, depois de 74, vínhamos sempre a Portugal passar o verão. Os meninos adoravam, e nós também. O calor fazia-nos bem.”

“É possível comparar o Portugal antes da Revolução com o Portugal que temos hoje?”

R: “Não, nem pensar. Não há comparação. Tanta coisa mudou desde então… tanto é que até se estranha quando se conta como viviam as pessoas cá naquela altura. É claro que ainda há pobreza e problemas, todo o país os tem, mas já não é numa escala tão… absurda. É, era mesmo absurdo aquilo. Os jovens deviam dar mesmo muito valor às liberdades que têm hoje em dia, quando nós, enquanto miúdos, mal podíamos dar as mãos na rua como medo da PIDE e assim. Era um outro mundo, quase.”

“A Dona Adelina acha que, nos dias atuais, Portugal poderia voltar a ser uma ditadura?”

R: “Espero bem que não, ou que não esteja viva para ver tal coisa. Mas há sempre esta possibilidade, e não sei se as pessoas se apercebem disso. Primeiro, aparece um jeitoso qualquer com ideias de que ‘só um regime forte p’ra mandar o país p’ra frente’, e não muito tempo depois, temos outro Salazar no poder. As pessoas podem apoiar o que quiserem, têm esse direito. Mas quem acha que uma ditadura é solução, não viveu uma ditadura.”

 
*Sophia de Mello Breyner Andresen, poema "Esta é a madrugada que eu esperava"

Sem comentários:

Enviar um comentário