terça-feira, 20 de abril de 2021

Onde estava no 25 de abril?

 

Os alunos do K.Leio responderam mais uma vez ao desafio da professora Fátima Lopes no âmbito da disciplina de História. Desta vez, entrevistaram familiares, vizinhos e conhecidos sobre esse dia em que "emergimos da noite e do silêncio"*.

Entrevista a Elias Rodrigues

Muito bom dia, Sr. Elias. Desde já quero aproveitar para lhe agradecer a sua disponibilidade para esta pequena entrevista. Para iniciar, pode contar-nos como começou o seu dia 25 de abril de 1974?

Levantei-me normalmente e fiz a minha higiene pessoal. Após tomar o pequeno-almoço, despedi-me da minha mulher e segui para o trabalho. Para mim, era apenas mais um dia. Não sabia ainda o que vinha aí.

No caminho para o trabalho, notou algo de diferente, logo pela manhã?

Como trabalhava na Alameda, tinha de apanhar todos os dias o autocarro desde Moscavide, mas no caminho até à fábrica de estofos não notei nada de anormal a passar-se nas ruas. Tudo indicava que era apenas mais um dia de trabalho para toda a gente. Só quando cheguei ao trabalho é que me comecei a aperceber do que se estava a passar.

O que aconteceu quando chegou ao trabalho?

Logo que entrei na fábrica, alguns dos meus colegas já lá estavam, mas muito sobressaltados. Um deles pediu-me que ligasse a rádio, uma vez que no seu caminho até à Alameda tinha visto diversos militares e tanques na rua, nomeadamente no Terreiro do Paço, e todos, indignados, queriam saber o que se estava a passar. Logo que nos conectamos à frequência da Rádio Clube Português é que vimos que se estava a dar um golpe de Estado.

Quando ouviu a notícia, qual foi a sua reação e a dos seus colegas?

Todos ficamos com medo do que podia acontecer. Por exemplo, desencadear-se uma guerra civil entre as forças armadas (MFA) e as forças de segurança ainda fiéis ao Estado. Ninguém pensou, naquele momento, que o golpe sairia bem-sucedido. Alguns dos meus colegas regressaram a casa, outros saíram à rua para junto dos militares, quer por curiosidade, quer para ajudar no que pudessem, mas não sei até que ponto atrapalhavam o seu trabalho (risos). Poucos foram os que, como eu, ficaram a trabalhar.

O senhor decidiu ficar a trabalhar. Como correu o seu dia, consoante essa decisão?
Fui trabalhar para casa de um senhor na Avenida de Roma, para pôr cortinados e alcatifas. Em casa dele, a rádio esteve sempre ligada e nós íamos sempre conversando sobre as mais recentes notícias. Depressa percebi que o dono da casa era membro do Partido Socialista. Dizia sempre “A partir de hoje, vamos ter um governo socialista, oiça bem”. Quando descobriu que o golpe de Estado tinha corrido bem, ficou tão contente que ao pagar-me o serviço me deu uma gorjeta de 1000 escudos. Também eu fiquei muito agradecido (risos). Depois desse dia, ficámos grandes amigos e encontrávamo-nos muitas vezes para tomar um café/cerveja e conversar.

Quando o seu dia de trabalho terminou, ao voltar para casa, notou já diferenças na rua ou nas pessoas à sua volta?

Sim, muitas. Sabia que o Marcello Caetano já se tinha rendido e algumas forças armadas continuavam na rua a festejar, mas agora com cravos encarnados no cano da arma. Deu-me uma alegria imensa ver toda aquela cor e felicidade na cara das pessoas. No autocarro de volta para casa, festejavam uma revolução sem sangue, com ausência de feridos e mortos. Simultaneamente, o alívio que senti não foi completo, havia ainda muita incerteza acerca do próximo governo e do rumo que o país ia tomar.

Quando soube que o governo ditatorial tinha caído e que um novo ia tomar lugar, quais foram os seus pensamentos/expectativas?

Que estávamos a caminhar para a democracia. Logo a seguir ao governo provisório vieram as eleições, a primeira vez em toda a minha vida que votei. Senti-me muito importante, senti que estava a ajudar o meu país a seguir o caminho certo. O sentimento de ajudar a decidir o governo foi excelente, todas as pessoas na fila de voto sorriam e alegravam-se com a esperança de ter uma vida melhor dali para a frente.

Beatriz Simões, 12º F

*Sophia de Mello Breyner Andresen, poema "Esta é a madrugada que eu esperava"

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