«Pousou a mão direita
sobre o prato da balança e perguntou: «Mãe, quanto pesa a minha mão?»
Haviam
passado sete dias desde que começara a chover, mas graças aos telhados, aos
beirais, aos algerozes, às sarjetas, às intrincadas redes de canais subterrâneos
que formavam aquilo a que se costuma chamar saneamento básico, graças até à
própria morfologia do bairro que antes de ser bairro havia sido apenas um
monte, sete dias consecutivos a chover não tinham provocado danos materiais de
registo.(…)
«Ao
sétimo dia, era sábado, e a mãe explicou-lhe que não era possível pesar a mão.
Só se a separássemos do resto do corpo, o que não era boa ideia. Por isso, o
que o ponteiro vermelho indicava não era o peso da mão, mas a força que ela
estava a fazer.
Ouvindo isto, Duarte fez força sobre o prato
da balança, até o ponteiro dar quase uma volta completa, e perguntou à mãe se
aquilo era muita força. A mãe respondeu que sim, que era muita força, que o seu
filho lindo era muito forte. Depois, deu-lhe duas tabletes de chocolate e
pediu-lhe para os partir aos pedacinhos, e para ir juntando os pedacinhos todos
em cima do prato da balança, até o ponteiro chegar à marca dos trezentos
gramas: «trezentos gramas é aqui.»
Duarte cumpriu as indicações à risca e, a
seguir, fez o mesmo com a manteiga: trezentos gramas de manteiga, trezentos
gramas de açúcar.
Perguntou:
«Mãe, achas que a minha mão também pesa trezentos gramas?»
A
mãe segurou-lhe na mão e disse que talvez pesasse um bocadinho menos. Para aí
uns cento e cinquenta ou duzentos gramas?»
A mãe segurou-lhe na mão e disse que talvez
pesasse um bocadinho menos. Para aí uns cento e cinquenta ou duzentos gramas.
Largou-lhe a mão e deitou a manteiga e o açúcar para dentro de uma tupperware verde em forma de abóbada, e
pediu-lhe que os misturasse.
Duarte
percebeu que era difícil misturar a manteiga e o açúcar, e pensou que talvez
não fosse assim tão forte como a mãe dizia.
Perante
o seu momentâneo desânimo, a mãe encheu uma panela com água e deu-lhe nove
ovos. Disse: «Põe os ovos, um a um, dentro de água, com cuidado para não se
partirem. Os que forem ao fundo, estão bons, os que vierem ao de cima, estão
estragados.»
Duarte perguntou se não deveria ser ao
contrário: os maus a irem ao fundo e os bons a nadarem.
João Ricardo Pedro, O teu rosto será o último
João Ricardo Pedro estará à conversa com os leitores da MAIOR no dia 28 de setembro, pelas 15:10 horas, na biblioteca.