segunda-feira, 26 de abril de 2021

Onde estava no 25 de abril?

 
Os alunos do K.Leio responderam mais uma vez ao desafio da professora Fátima Lopes no âmbito da disciplina de História. Desta vez, entrevistaram familiares, vizinhos e conhecidos sobre esse dia em que "emergimos da noite e do silêncio"*

Amadeu Vieira, 69 anos

09/04/2021 18:00

1. Como foi a sua infância durante o Estado Novo?

A minha infância foi a trabalhar. Não havia possibilidades para outra coisa. Os pais eram pobres, portanto, tive de trabalhar muito cedo.

2. Foi à escola? Como foi a sua experiência escolar durante o regime?

Sim, só fiz até à 4ª classe. Era uma escola de crianças, embora na altura as crianças fossem mais adultas. Portanto, o ensino que hoje se faz até ao 9º pelo menos, praticamente dávamos até à 4ª classe, enquanto hoje está mais dividido. Naquela altura não, cada ano era mais exigente. Tínhamos que nos sujeitar também às regras dos professores, às regras da escola, portanto não havia fugas possíveis.

3. Durante o Estado Novo, como era o seu dia a dia?

Enquanto estive na escola brincava e estudava. Como adulto, o meu dia a dia foi logo a trabalhar. A minha infância de brincadeiras de rapaz foi só no período de escola.

4. Com que idade começou a trabalhar e onde? Como eram as condições de trabalho?


Tinha 11 anos quando saí da escola e comecei a trabalhar. Primeiro como garagista, depois, como empregado de balcão de uma mercearia. Depois fui para os estaleiros, comecei a trabalhar lá já como uma profissão que ano após ano foi sempre melhorando porque era uma empresa muito grande, portanto tinha mais regalias.

5. Sentiu a sua liberdade de expressão limitada durante o Estado Novo?

Sim, na altura do Estado Novo havia repressão não só em expressar-se como em várias coisas. A repressão era visível, embora, com a minha experiência não tínhamos muito conhecimento do que era a política. Estávamos sujeitos às regras e fazíamos precisamente isso.

6. Tinha medo da PIDE ou de fazer qualquer coisa que pudesse ter tida como ofensa ao regime?


Não, porque não saía fora do normal, por falta também de conhecimento. Não entrava em lutas partidárias com ninguém, portanto não senti essa repressão. Senti mais a autoridade que havia de todos os órgãos de chefia. Cada posição hierárquica já era uma autoridade superior e eu respeitava-as, quer fosse no trabalho, na escola ou em qualquer lado respeitava a hierarquia.

7. Esteve na Guerra Colonial?


Sim. Primeiro estive na tropa cá e depois fui para o Ultramar, na Guiné-Bissau.

8. Como foi a sua experiência no ultramar?

Lá tínhamos pouca informação sobre o que se passava em Portugal. A Revolução foi vantajosa pois pude vir mais cedo do ultramar, porque começaram as negociações e a entrega das colónias aos africanos e obrigou a que fossemos desmobilizados mais cedo. Assim, só estive pouco mais de um ano na Guiné, embora a norma fossem dois anos ou dois anos e meio. Quando regressei, voltei a ocupar o meu lugar nos estaleiros e fui melhorando.

9. Quantos anos tinha no dia da Revolução?

Tinha 22 anos.

10. O que se lembra sobre o dia 25 de Abril de 1974? Onde estava?


Quando se deu o 25 de Abril estava precisamente na Guiné-Bissau. Íamos fazendo algumas perguntas aos oficiais até que nos reuniram e explicaram o que tinha acontecido cá em Portugal, pois as notícias eram muito vagas e não tínhamos acesso a rádios, no Mato. Explicaram-nos que foi um golpe de Estado em que, na altura, estavam as tropas na rua, e iria ser formado um Governo militar, e uma Junta de Salvação Nacional, que iria governar o país durante um período de tempo até depois se desenvolverem os processos políticos.

11. Qual foi a sua reação ao saber das notícias? Como se sentiu?

Quando nos contaram sobre o golpe de Estado sentimos alegria, até porque foi-nos informado que tudo ia modificar. Só o final das guerras coloniais já nos alegrava muito.

12. A seu ver, o que mudou com a Revolução dos Cravos? Em que áreas surgiram mudanças maiores?

Senti mais liberdade. Podia dizer aquilo que sentia. Já podia responder a um chefe ou uma pessoa superior a mim que até aí não o fazia.

Os partidos políticos começaram-se a desenvolver a partir do 25 de Abril. Começaram-se a formar novos partidos, cada um com as suas exigências e as suas lutas. Fomos formando também lutas através dos sindicatos, fomos ganhando mais direitos, mais regalias das empresas onde depois, nos anos seguintes, começou-se a ter um nível de vida bastante aceitável. Não digamos que era uma coisa extraordinária, mas já se aceitava em relação àquilo que era.

13. Aponte uma coisa que antes não podia fazer mas agora pode?

Éramos oprimidos. Não tínhamos direitos de expressão, de movimentação como se queria. Agora não temos isso, mas também não podemos exceder os nossos limites e direitos.

14. Quais considera que sejam as maiores diferenças entre os tempos atuais e a época do Estado Novo?

As maiores diferenças foram o próprio desenvolvimento do país. Foi uma diferença muito grande. Começou a haver melhor saúde, mais escolas, e o país desenvolveu-se com uma margem muito grande. Em termos de habitação e de acessibilidades houve um desenvolvimento muito grande em relação ao Estado Novo.

Bruna, 12º F

*Sophia de Mello Breyner Andresen, poema "Hoje é a madrugada que eu esperava"

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